Sunday, March 9

do eco, dos ecos que mediam as distâncias como um risco...

o sr. catarino não contava histórias, contava coisas, isto é, descrevia os sons, a consistência disto e daquilo, a dureza quebradiça das folhas secas, e ensinou-me que nunca esgotamos uma coisa, que podemos passar a vida inteira a dizê-la, que uma coisa é um mundo tão grande como o maior dos mundos, quer dizer, os mundos têm sempre o mesmo tamanho, eu via-lhe os olhos de sal que não me viam e pensava: está a ver-me: o céu hoje é diferente do de ontem, sinto-lhe o peso nos olhos, e hoje o céu pesa mais, de um modo mais escuro, ontem, era leve e quente e mais claro; hoje, cansam-se muito as coisas; ontem, corriam as coisas sem nunca se cansar; hoje, a tarde é tão pequena que se me cola às mãos; ontem, era um dia tão grande que me perdi nele;

«sr. catarino, deve ser bom estar cego.», nem bom nem mau, se tens medo do escuro parece que ele te asfixia, mas se o amas, é o sítio onde te escondes para respirar; eu estou cego, mas na minha cegueira sei a diferença entre a luz e a sombra, e nessa diferença vejo esperança, ou melhor, a luz, sítio que precisa de nome, e esperança é um belo nome.

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