- Que está ai a fazer criança? Pergunta dona clotilde, sentada nos degraus de pedra, eu ouvia-lhe as palavras caírem pingo a pingo na noite dos seus olhos, e respondi-lhe: estou, não estou, abandonada como um ucraniano ou um croata? e era uma pergunta tão cansada de qualquer resposta, antecipando o movimento impreciso das mãos que se tocaram como se se quisessem reconhecer: esta é a minha mão este é o meu corpo, criança caiu? e isto pareceu-me uma calúnia, porque na verdade tinha caído, resvalava somente pela borda do rochedo a pensar: dona clotilde amanhã vai ver-me aqui estendida e vai dizer criança que lhe aconteceu, e eu responderei: isto foi isto que me aconteceu, e ela ir-se-à embora cuidadosamente, e eu ouvirei esse movimento que não quer ser ouvido, ouvi-lo-ei como um movimento que se esconde no seu próprio vagar e pensarei: meu Deus estou bêbeda tão bêbeda, e ela voltará aos degraus: criança que disse?


- Respondo-lhe: sei lá, enquanto desvio o olhar que escorrega ao longo do rochedo, ao longo da eternidade desse branco, vazio, desse pingo a pingo como a dor intermitente e contínua, e murmuro: é asssim a vida e foi assim..., e dona clotilde pergunta: que disse, e eu respondo-lhe: nada nunca disse nada, e ela aproxima o ouvido da minha boca - ouvido a crescer - que disse: volta a perguntar-me: disse para se ir embora disse que tem pena de mim disse longe longe longe, e então ouvi o seu soluço a afastar-se ao voltar costas devagarinho, um pequeno soluço como uma pequena história.