Friday, July 13

- Onde estás?, não para saber onde está, mas para ouvir, ou ouvir talvez o tamanho do abrigo nesse espaço que a voz limita, estou aqui: responde-lhe, e o aqui é somente um lugar à distância da tua voz, onde ela ainda chega, como todas as conversas que se encontram e se cruzam, e as janelas abrem para outras janelas, que abrem para um escuro fumacento, de onde saem as vozes fios de som que se esgarça, bons-dias bons-dias,


- Onde estás? estou aqui: disse eu, aqui onde?, aqui junto à janela, ao silêncio do vidro que são os barulhos da rua, que brincadeira é essa?, que estás a fazer?, não houves o telefone?, e eu começo a ouvi-lo, som que vem de antes de o ter começado a ouvir e me quer falar, ou te quer falar, enfim, um som que quer falar, basta erguer o auscultador, o telefone cala-se. O telefone volta a tocar, e eu afasto-me, agarro no auscultador e antes de perguntar: está?


- Ouço-te: sou eu, pergunta: quem é?, e eu respondo: é para mim, não foi isso que perguntei: diz, eu digo: é isto que eu quero dizer, e pergunto-te: que queres?, e tu dizes: quis telefonar-te, como soubeste o meu número?, ris-te, e depois dizes o meu nome, que ouço como se fosse o teu, e pergunto-te: é o teu nome?, e tu respondes-me; não, é o teu, diz: sempre esses telefonemas, sempre esses segredos, e eu rio-me, estás a rir-te de mim?, perguntas, não estou a rir de mim: respondo: de tu seres um segredo, e desligo, um segredo é,


- Ouvir-te a ansiedade, é ver-te e não te reconhecer, mas lembrar-me da tua pele, um segredo é o futuro a transparecer no teu ombro, entre mim e ti há esta mancha arredondada que é o teu futuro e que tu não ves, eu mal vejo, um segredo é o futuro que se mostra aos olhos dos outros, que os nossos estão cegos, são cegos, tão cegos, para o que nos mata.

5 Teardrops:

Blogger TP * said...

grande texto! *

7:09 PM, July 13, 2007  
Anonymous Anonymous said...

Adorei o que escreveste.^^
Muito bem escrito.

Bye~

1:21 AM, July 14, 2007  
Anonymous Anonymous said...

Voltei ao teu blog, e em boa hora! Este teu último texto é muito original, quer pelo conteúdo quer pelo formato do diálogo. Lindas frases: "um escuro fumacento, de onde saem as vozes fios de som que se esgarça, bons-dias, bons-dias"
E o final: "entre ti e mim há esta mancha arredondada que é o teu futuro e que tu não vês... e mesmo o final: "são cegos, tão cegos para o que nos mata"

8:24 PM, July 14, 2007  
Blogger Tiago Ramos said...

Gostei, vou guardar, vou voltar. muito bem escrito.

10:38 PM, July 14, 2007  
Blogger Catharina said...

Se não foi boa hora essa dona margarida! É sempre um prazer te-la de volta. Um beijinho e obrigado

5:29 PM, July 15, 2007  

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